sáb. jun 7th, 2025

O mundo sem cartórios como conhecemos?

Vamos direto ao ponto. Hoje temos tudo pronto para o seguinte cenário: um cartório mundial onde qualquer um pode ter sua “Conta” (valeria como firma reconhecida e tudo mais). Você poderá fechar um contrato (de qualquer coisa) com qualquer um que tenha também essa “Conta” no cartório mundial. Esse contrato (ou apenas as informações que realmente precisam) ficarão disponíveis para qualquer um consultar/validar a qualquer hora, valendo como garantia para qualquer área jurídica ou poder público uma vez que qualquer perícia ou auditoria comprovará a veracidade desses dados.

Além disso, você pode ser uma pessoa, empresa, órgão público, um carro, casa ou qualquer outra coisa (vai depender do tipo de contrato ou transação que quer registrar). Estranho? Se é um carro, pode aceitar um contrato de revisão automaticamente quando os aparelhos da concessionária fizerem seu check, informando inclusive seu KM e/ou outros dados. E tudo como se fosse um contrato registrado em cartório, de forma automática, já pensou?

E não é só isso! Qualquer um poderá pegar para si (baixar uma espécie de arquivo na internet) com TODOS os contratos que esse cartório registrou, desde o início do seu funcionamento, e ter isso sempre atualizado conforme todos vão usando. Assim você tem uma cópia de tudo e, veja só, será um dos que ajudam ao cartório ficar sempre disponível para quem quiser usá-lo, dispensando a necessidade de ter um serviço para “guardar” essas informações na internet de forma paga, com segurança máxima e caríssima, como os bancos fazem hoje. Estranho? Perigoso?

Primeiro, vamos ver pelo lado de ter isso sempre disponível. Imagine que seria como compartilhar uma música na internet: você compartilha com 100 mil pessoas essa música. Se qualquer equipamento seu quebrar ou acontecer um problema sério e você perder a música, basta acessar a internet e pegar de alguém que você compartilhou. A coisa vai mais além, se alguém alterar qualquer coisa na música, as outras cópias não permitem que essa alteração se propague para “estragar” a qualidade do arquivo, dessa forma sempre que você tocar a música ou precisar baixá-la, sua música está disponível e em com a integridade garantida.

Além disso, o conceito usado para a geração desses contratos torna impossível que alguém altere as informações e consiga espalhar essa alteração por todos os lugares (vamos ver isso melhor mais pra frente).

Mas não para por aí, se quiser participar, pode ser um de seus auditores para checar se tudo está correto, ganhando uma pequena comissão daquele que registraram a transação. Como não há dono, não há nenhuma grande margem de lucro ou custo, logo os custos de registrar uma transação seria apenas a comissão para um dos “auditores” certificar que está tudo “OK” no contrato que foi criado. Com isso, chega de atravessadores, taxas, pagar várias vezes a mesma tarifa, filas, burocracia e tudo mais.

Mas com tudo isso, ainda seria seguro? Não só seria seguro, como seria mais seguro do que qualquer modelo de cartório que temos hoje, dado que não haveria a intervenção humana para validar ou não um contrato e, principalmente, dar o famoso “jeitinho” quando se realmente quer burlar algo. Isso seria feito por preceitos computacionais, onde o “auditor” apenas faria uma série de operações matemáticas para atestar que um dado contrato está ou não “OK”, abrindo inclusive a possibilidade da permitir o anonimato das pessoas, uma vez que suas assinaturas digitais podem ser usadas para identificar todos os envolvidos no contrato e essa assinatura seria uma “uma sopa de letrinhas” que não identificaria ninguém.

Parece um absurdo?

É, confesso que tende a ser meio assustador pensar em algo tão diferente. Mas pense em como estamos na mesma, sempre a mercê de pessoas estranhas (ou empresas estranhas como um banco) para, no fim, aprovar tudo. Entregamos a esses tudo que somos: documentos, endereço, comprovantes para tudo! Precisamos efetivamente comprovar que nós somos nós a todo momento para que a gente consiga fazer coisas básicas como receber um salário, pagar um café, comer ou transferir a propriedade de qualquer coisa.

Além disso, tem os custos, que não são nada pequenos! Fora a sensação de jogar tempo e dinheiro no lixo, o incômodo de ter que ir num lugar lotado, demorar horas, muitas vezes ser tratado com descaso só pra falar que você é você ou que aquela assinatura é sua de verdade, correndo o risco ainda de, quando você precisa usar essa comprovação juridicamente, alguém virar e dizer “é… igualzinho a minha assinatura, mas não fui eu que assinei”, mesmo tendo o registro feito em cartório (há políticos fazendo isso a todo momento, lembra?).

Mas eu teria que deixar meus dados pra todo mundo ver?

Não! Como um banco sabe que você é você na hora de autorizar um débito? Ele usa um conceito chamado “senha“, certo? Agora tente pensar fora do padrão e acompanhe o raciocínio: se você aparece no cartório mundial e fala que quer uma conta e o cartório te da uma senha e um número único no mundo, o que mais você precisa pra falar que você é você?

Calma, não desista ainda. Vivemos uma realidade que é o contrário: você mostrar ou entrega um monte de documento para provar que você é você, então recebe a senha. E se fosse ao contrário? Você recebe uma senha só sua e toda hora que eu quero saber se você é você, eu peço seu identificador único e, quando você me entregar, você prova que o identificador único é seu apenas inserindo no sistema (sem eu ver) a senha que eu te dei para provar? Quem, além de você mesmo, teria essas duas informações?

Se você pensar “posso passar pra alguém ou pegar de alguém” é o mesmo que dizer que você pode roubar a senha do banco de alguém, junto com o seu cartão, ou passar o cartão e senha para outra pessoa, ou seja, seria uma transgressão da lei em ambos os casos, certo? Aqui temos uma ligeira vantagem porque esses dados não são tão fáceis assim de “pegar”, mas é claro que esse problemas pode existir, como já existe hoje.

Agora vamos seguir. Esse código único faria a vez da sua assinatura em qualquer contrato, então para que um contrato fosse firmado (criado), ele teria seu identificador (código único), o identificador da outra parte e o objeto do contrato. O contrato então entraria para verificação e, assim que o auditor desse o “OK” dele, esse contrato é efetivado de verdade.

Então vem a dúvida: qualquer um poderia pegar seu código único, colocar em contratos e registrar? Não! A cada vez que um contrato for criado com todas as informações que falei, aqueles que estão envolvidos no contrato precisam comprovar que realmente “querem firmar um contrato” informando sua senha ao sistema. Só com essa comprovação por senha de ambos os envolvidos que um contrato entraria na fila de validação e efetivação. Caso contrário não haverá como registrar nenhum contato no cartório mundial porque simplesmente você não confirmou, entendeu?

Quando qualquer um baixasse todos os contratos do Cartório Mundial, esses contratos teriam apenas os códigos únicos de tudo que fosse envolvido no contrato, logo ninguém saberia quem são envolvidos, mas se os envolvidos apresentassem seus códigos únicos e comprovasse que esses códigos são deles através da validação por senha, logo aquele contrato registrado pertence a aquelas partes sem sombra de dúvida (seria como quando você digita sua senha no caixa eletrônico).

OK, mas e os contratos? Todos veriam seu conteúdo?

Essa é outra ótima questão. Tudo que circula no meio digital tem uma espécie de “impressão digital” que permite com uma exatidão absurda (e sem falhas) que qualquer coisa digital, com aquela impressão, possui sempre o mesmo conteúdo, seja ele qual for.

Sendo assim, uma das partes envolvidas no contrato, além de pessoas, pode ser… adivinha? Um arquivo DOC, PDF, XLS, TXT, HTML, um texto ou qualquer coisa digital. Ele ganhará um código que, sempre que você quiser verificar se futuramente um arquivo possui exatamente e precisamente o mesmo conteúdo do que foi colocado no contrato, basta você submeter ao cartório mundial e ver se o código digital gerado é igual ao que está no contrato. Aqui vale um ponto importante, o termo “exatamente igual” é algo muito, muito, muito literal. O conteúdo digital que vai ser verificado tem que estar tão exatamente igual que se for um documento do Word, por exemplo, o texto estiver igual, mas faltar um negrito em algum lugar, tiver um espaço extra ou a margem do documento estiver diferente, ou qualquer outra coisa, a “digital” desse documento será outra completamente diferente. Essa premissa vale pra outros arquivos, imagens ou qualquer conteúdo digital.

Isso é tão literal que é impossível matematicamente e estatisticamente “falsificar” um documento com qualquer conteúdo que não seja o conteúdo do documento registrado no contrato. Essa ação é tão rígida e já foi tão testada que é usada hoje em todos os sistemas que requerem grandes seguranças.

Voltando, e aqui é o ponto principal. Se temos:

  1. As “assinaturas” dos envolvidos identificados pelos seus códigos únicos.
  2. A “impressão digital” do conteúdo digital que servirá como detalhamento do contrato.
  3. A data exata (com hora, minuto e segundo) que o contrato foi celebrado.
  4. o OK do auditor.

Você tem tudo que um cartório precisa para atestar qualquer transação com 100% de confiabilidade, com o bônus de não precisar identificar nenhuma das partes ou ter necessariamente o documento usado como contrato (pra qualquer finalidade necessária), garantindo assim o anonimato completo de todos os envolvidos assim como o que foi acordado entre eles. Mas se houver uma ação que requeira a comprovação dos envolvidos e o conteúdo do contrato, basta que eles se apresentem, com seus códigos únicos de identificação, e comprovem que são eles mesmo através da validação de sua senha e qualquer um deles prove que o documento digital que está apresentando possui a mesma “impressão digital” do documento registrado no contrato. Dessa forma, qualquer autoridade pode comprovar se é verdadeiro ou não qualquer contrato.

Mas e se houver modificações no contrato, uma vez que todos vão ter isso ou ter acesso?

É simples, o conceito utilizado (que já tem ao menos 20 anos) garante uma única premissa:tudo que é registrado é imutável, ou seja, nunca mais pode ser mudado, excluído, editados, arrumado ou qualquer que seja a ação.

Errou? O valor não era aquele? O nome gravado no documento estava errado? A série do equipamento está errada? Seja o que for, se quer alterar ou cancelar, tem que fazer outro contrato para dizer isso. Tão simples quanto isso!

E como se verifica que não houve modificações? Todos os contratos são “intimamente” ligado um no outro através da sua “impressão digital” (afinal, o contrato também é um documento digital). Isso funciona como uma corrente onde cada elo é um contrato e a ligação entre eles é sua assinatura digital. de forma que, se qualquer coisa alterar um contrato, essa ligação se quebra e não há como reorganizar como era antes por conta da “impressão digital”, logo o cartório mundial não aceita esse tipo de ação, ou melhor, aqueles que tem cópias vão ver que essa transação transgride a premissa da “imutabilidade” (nada pode ser alterado) e vai rejeitar essa ação, dando um NÃO OK no contrato alterado e descartando ele. É mais ou menos como você tentar trocar o filho de uma mãe sem que ela perceba isso.

Isso já existe mesmo?

Sim! Isso é uma das aplicações quando citam a palavra “blockchain”. Embora essa palavra esteja muito vinculada ao Bitcoin e outras “moedas virtuais” ou “criptomoedas”, seu conceito descreve exatamente o que foi dito aqui e há muitos projetos bem sérios para fazer isso. Há muitas empresas, bancos e governos em fortes testes para adotar isso como forma de sanar vários problemas de confiança, lentidão, falta de segurança e entraves burocráticos existentes.

Forte abraço!

 

Fonte: https://www.linkedin.com/pulse/o-mundo-sem-cart%C3%B3rios-como-conhecemos-alessandro-rocha-emerich/

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